ENTREVISTA de Ângelo Rodrigues concedida ao jornalista Carlos Leite Ribeiro - Portal «CÁ ESTAMOS NÓS», janeiro de 2000


Quem é Ângelo Rodrigues?

Sou português e também por isso, cidadão do mundo. Não sei se sou poeta mas gostaria de o ser porque sim. Gosto de deusas atrevidas, da Noite, do Mar, da espécie-Mulher, de boa música e de alguma poesia. Sou, como alguém já escreveu, «um ser intelectualmente inquieto, irrequieto, insatisfeito e inconformista» que procura despertar as consciências adormecidas pela rotina das ideias feitas, das convenções, dos sistemas. O meu horizonte imediato é a Alma humana. Coloco e tento actualizar a toda a hora a velha e primordial questão universal: O que fazemos aqui? - Para onde vamos? - O que nos espera(?).
Tenho a carteira de Equiparado a Jornalista e exerci irregularmente a actividade na Imprensa Regional e na Rádio. Fui fundador e vice-presidente da AJEP - Associação de Jovens Escritores de Portugal (de que muito me arrependo); fui director literário das Edições Orpheu; sou, presentemente, director literário do DNA da Editorial Minerva. Editei livros e CD's (de poesia e de música) e coordeno algumas antologias e colectâneas de poesia e prosa. Prefaciei alguns autores de língua portuguesa. Fundei e apresento de quando em vez, em Lisboa, a Tertúlia Orpheu. Tenho três livros publicados e uma colecção de postais, respectivamente: «Eu, o ser e a dúvida», «Compra-me Um Deus», «Da Ressurreição do Espanto» e «Fragmentos do Tempo Parado». Sou um dos autores da colectânea «Bosque Flutuante - Nova Poesia Portuguesa (12 autores). Fundei os Jograis Orpheu e produzi o CD de poesia ASSIM SE DIZ gravado ao vivo no Padrão dos Descobrimentos em Lisboa - com o apoio da Câmara Municipal - em Junho de 1999.
Participei em muitos saraus, colóquios, congressos, performances e eventos culturais e afins como apresentador, animador cultural, autor-declamador, conferencista, músico-compositor e actor. No âmbito das artes plásticas, (colagem, desenho e fotografia artística), utilizo o pseudónimo Miguel d'Hera. Idealizei e organizei também, alguns espectáculos multimédia.
Como radialista, realizei e apresentei entre outros, os seguintes programas de temática literária: «Poetas da Noite», «As Palavras do Poema» e «O Espelho das Palavras». Na Rádio Renascença realizei e apresentei o programa «Tempo de Poesia». Mais recentemente, apresentei, na Rádio Voz de Almada, o programa «Espírito da Manhã».
E num dia efémero de hábitos estúpidos e terrivelmente convergentes (como no caso do Trabalho), escreveu o meu amigo Miguel d'Hera no seu diário-não-autorizado: «Ângelo Rodrigues é um eclético, um ecuménico, um-criador-de-absoluta-insatisfação; é também um humanista do desejo e da ousadia, um provocador de impossíveis, um moscardo farpizante de conservadorismos e de estabilidadezinhas, um arauto da diferença, um místico do devir».

Onde nasceu?

Nasci em Torres Novas em 1964. Era cristã - Terceira Vaga.

Sua geografia?; sua História?; suas tradições; suas gentes?

Adoro o meu país. Portugal ainda vai ter a "garra" e a pujança da Grécia-Antiga. Não me apetece explicar porquê. A minha História dava um grande filme trágico-cómico. Sei que estou na primeira reencarnação. Ainda há muita História para se cumprir. As minhas tradições são essencialmente ribatejanas - gosto de touros e de cavalos mas não gosto de touradas, excepto algumas que costumo ver na televisão - com pessoas - e que me divertem imenso. Adoro a minha gente - todos aqueles que são mais do que simplesmente homens - que são, de facto, Pessoas!

Sua infância?

A minha infância foi problemática. Sou o segundo filho de três. Meu pai teve três mulheres e casou duas vezes. Era, quando miúdo, um autêntico gringo. Roubava fruta, faltava à escola, chegava tarde a casa e coleccionava tudo o que encontrava. Apesar de tudo, os meus pais são as melhores pessoas do mundo - que muito admiro - pelas dificuldades que tiveram e pela capacidade que tinham de as ultrapassar de uma forma artística - divergente.

Seus estudos?

Sou Licenciado e profissionalizado em Filosofia pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa e professor de Filosofia e de Psicologia no ensino secundário. Sou, contudo, um ser antiacadémico. Passei pelo Conservatório de Música, pelo ensino de Educação Musical e pelo curso de Filosofia da Universidade Católica Portuguesa de Lisboa.

Quando era pequeno o que sonhava ser?

Astronauta, Aviador, Cientista.

Ídolo de adolescência?

A minha professora de Filosofia bem como uma minha vizinha muito bela de pura poesia fisiológica e alguns poetas da praça.

Em que época gostaria de ter nascido?

Gostaria de poder re-nascer no princípio de cada século. Acredito no Eterno-retorno à maneira dos gregos. Cumprimentos ao Platão!

Sua actividade profissional?

Sou professor de Filosofia e de Psicologia no ensino secundário. Coordeno projetos literários para várias editoras por paixão. Desbravador de sonhos. Gerente de almas inquietas como a minha. Talvez poeta.

Sua actividade lúdica?

Dormir é a única coisa que posso considerar lúdico.

Sua filosofia?

Paz. Amor. Liberdade. Autonomia. Imortalidade.

Metas já atingidas?

A minha querida mulher e o meu adorado filho.

Outros comentários?

A minha "oficina de poesia" está muito desarrumada. Quantas vezes tentei pôr tudo em ordem e nada - a preguiça fala sempre mais forte e abafa a voz da vontade e até da paixão. Costuma-se dizer que "de promessas está o Inferno cheio". Parafraseando este provérbio, diria: de projectos está o dito a abarrotar; contudo, é minha intenção, até ao final do milénio (fica bem falar nisto agora - dá um ar místico à coisa), fazer algumas "coisinhas" de índole literária e afim, isto é, sem compromisso para ninguém e no âmbito da minha actividade secundária ou talvez quaternária ("editor"), tenciono continuar a revelar novos valores da literatura (sabe-se lá o que é isso!) e dar-lhes voz através da edição dos seus trabalhos, a organizar sessões de apresentação de livros e, vamos ver, talvez consiga dar forma ao projecto do CD de Poesia «Aventuras Poemáticas» - 30 "poetas" portugueses ditos pelos Jograis Orpheu (de Lisboa) de que faço parte e com produção minha. Certo é, já no próximo mês de Março, a edição do Volume III da antologia Poiesis (cerca de 100 autores portugueses, do Brasil e dos PALOP) e a edição de duas colectâneas de poesia e de prosa-poética. Bem, no meu caso, isto é, só e apenas enquanto "escritor" ou poeta e sem arrogâncias nem pretensiosismos, gostaria de dar alguma ordem ao computador imprimindo os ficheiros espalhados por tudo quanto é sítio e organizar uma colectânea dos meus minimalistas escritos inéditos sobre tudo e sobre nada (é de gritos escrever sobre o nada!) e que abarcam todos os géneros ditos literários: aforismo, poesia, crónica, diário, conto, ensaio, filosofia, verborreia (este género/estilo que é muito meu é mais utilizado quando chamo - com frequência - nomes feios ao Ministério da Educação - esta está pela hora da morte - ser professor é algo de heróico - se perguntarem porquê, eu explico - (de preferência pelo telefone).
Aproveito esta oportunidade para vos apresentar o meu outro Eu: esse mesmo, o Miguel d'Hera, é alguém que usa apenas o meu corpo mas que tem outra alma - podia até falar um pouco de metempsicose, reencarnação e tal, mas... fica para outra altura - este outro que também sou eu, dedica-se também às Artes Plásticas e no princípio do próximo ano tem mais ou menos agendada uma exposição individual (colagens em cartolina e tela) que tenciona fazer circular um pouco por todo o país - até lá, vai expondo colectivamente - a mais próxima será a exposição colectiva na Oficina da Cultura em Almada juntamente com artistas plásticos "bastante consagrados" (outra coisa que não sabemos bem o que é). Para não me alongar mais, direi: as minhas colagens, perdão, as colagens do Miguel d'Hera, são "pura" poesia. Um dia, se estiverem a fim, explico-vos isto.
Talvez seja disparatado dizer-se - por esta via - que estamos a escrever um romance - um romance é realmente coisa séria e, com 35 outonos, talvez seja pretensioso querer escrever um romance. Meu d(eus)!, há tantos romances!, o problema é encontrar um BOM romance. Bem, se me deixar destas tretas e for sincero, direi que várias vezes olhei o computador (tudo o que faço neste pequeno-grande mundo de escrita e de edição é feito ao computador e sem rascunhos - talvez seja por isso que me arrependo quase sempre do que escrevo!) o computador "olhou" para mim, nos apaixonamos, nos odiamos, escrevo sem parar qualquer coisa que na altura me parece interessante e que no dia seguinte se apaga ao som de um singelo bocejo: mas que nódoa!, estive eu a perder tempo com isto..., melhor estivesse a dar uma... pois... Confesso: deixa-me um pouco melhor, tranquilizando a minha constante inquietação e insatisfação, aquele amigo que ao vir jantar a casa diz: é pá, isto é interessante!; e eu respondo, talvez, mas... vai ter o destino dos outros, o doce vazio sideral. Porra, escrever é mesmo difícil! E debato-me sempre com aquela ideia que parece ter sido do Wittegenstein: já tudo foi escrito e dito, o mais importante é o que falta dizer. Estou eternamente condenado ao que falta dizer. Este comentário não tem importância nenhuma. O melhor comentário está sempre no futuro, no que falta dizer, no não-dito... é isso mesmo que me consola, tudo aquilo que não foi dito. Pois sim, falava eu do meu hipotético romance; prometo, quando for rotulado por um publicista pois críticos não há, terá como rótulo algo parecido com isto: eis um romance cujo tema é aquilo que não foi dito e que faltava dizer. Talvez se venha a chamar: «É proibido voltar a este tema - está dito e mais nada há para dizer, se dizerem é plágio». Sempre gostei de títulos grandes!
Conselho: Leiam poesia!, se possível, tentem viver poetica-mente - é preciso ressuscitar o espanto (onde é que eu já ouvi isto!).

Qual a característica que mais aprecia em si?

A sinceridade.

E nos outros?

A sinceridade.

Qual foi o maior desafio que aceitou até hoje?

Casar e ter um filho.

Que género de filme daria a sua vida?

Um filme trágico-cómico à boa maneira de Fellini.

De que mais se orgulha?

De ser pai.

Que vício gostaria de não ter?

O vício de trabalhar.

Uma imagem do passado que não pode esquecer?

Os cabelos sempre-brancos da minha mãe.

Seu prato preferido?

«Cozinha fervida» (feito pela minha sogra).

Deus existe?

Para mim é evidente.

O dia começa bem se...?

Quando o Sol entra pela janela como que a nos saudar; quando temos tempo para "calmamente" tomar o pequeno almoço em agradável conversa; quando não há horas para chegar...; então, talvez possamos dizer que o dia começa bem.

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